CIBERESPAÇO: UMA ABORDAGEM ACERCA DA APROPRIAÇÃO DESSE DISPOSITIVO COMUNITÁRIO E INTERATIVO PARA GERAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DE CONHECIMENTO E INFORMAÇÃO

Márcio Renan Correa Rabelo (Mestrando/UFS/marciorenancr@gmail.com)

Resumo: As novas tecnologias da informação e comunicação (TIC) não estão mudando apenas as formas de entretenimento e lazer, mas potencialmente todas as esferas da sociedade: o trabalho, gerenciamento e atividades políticas, atividades militares e policiais, principalmente no consumo (comércio eletrônico), além da comunicação e educação (Ensino à distância), enfim, estão mudando toda a cultura em geral. Este artigo procura analisar a apropriação do ciberespaço, mesmo que sem englobar a multiplexibilidade que esse dispositivo comunitário e interativo concentra nas interações entre indivíduos para suas relações sociais, econômicas, políticas e culturais; através das práticas e finalidades para quais tem sido destinadas em seu uso, focando sua análise na educação a partir da apropriação do ciberespaço com a finalidade de construção e distribuição de conhecimento e informação em rede a partir de AVAS. Esta análise se dará com o aporte da etnografia virtual como uma metodologia para estudos na Internet (HINE, 2000) e netnografia como um método interpretativo e investigativo para o comportamento cultural e de comunidades on-line (KOZINETS, 1997).

Palavras-Chave: Ciberespaço; Internet; Educação.

 

1 Introdução

A utilização das tecnologias da informação e comunicação (TIC), sobretudo a representatividade da internet nas relações sociais contemporâneas, potencializa o processo comunicativo, por sua vez amplia cada vez mais a geração e distribuição de conhecimento e informação, influenciando na formação da cultura e forma de interagir socialmente do indivíduo. Nesse aspecto, podemos destacar a Internet como uma das forças que regulam a sociabilidade contemporânea. Para Castells (2006, p. 255), a "internet é o tecido de nossas vidas neste momento. Não é futuro. É presente. Internet é um meio para tudo, que interage com o conjunto da sociedade". A internet como meio de comunicação, proporciona a interação e organização social, além disso, dita tendências e desenvolve comportamentos. Afirma ainda Castells (2006, p.255), "a internet é – e será ainda mais – o meio de comunicação e de relação essencial sobre o qual se baseia uma nova forma de sociedade que nós já vivemos". Esse pensamento é representado por processos mediados por novos dispositivos virtuais que proporcionam o comunicar e o saber e transformam essas próprias relações, além de agregar formas de colaboração flexíveis, resultando em processos de inteligência coletiva com experiências em rede, constituindo assim, o ciberespaço. Pierre Lévy afirma:

O ciberespaço, dispositivo de comunicação interativo e comunitário, apresenta-se como um instrumento dessa inteligência coletiva. É assim, por exemplo, que os organismos de formação profissional ou à distância desenvolvem sistemas de aprendizagem cooperativa em rede […] Os pesquisadores e estudantes do mundo inteiro trocam ideias, artigos, imagens, experiências ou observações em conferências eletrônicas organizadas de acordo com interesses específicos. (LÉVY,1999, p. 29).

  • A utilização dos novos dispositivos de processamento de informação e comunicação transforma as relações e interações entre as pessoas que resultam em uma cultura informatizada, designada como "cibercultura". Lévy (1999) analisa através da designação "cibercultura", como sendo, este novo espaço de interações disponibilizado pela realidade virtual, resultante de uma cultura informatizada. Sobre a cibercultura, o Vídeo 1 traz uma entrevista com esclarecimentos do próprio Lévy.

    Vídeo 1 – Entrevista com Pierre Lévy / Fonte: Radar Cultura

    A cibercultura já não é mais uma promessa, e sim uma realidade. Teixeira (2012, p.27) lembra que "Marcada pelas tecnologias digitais de rede, a cibercultura permeia o cotidiano das pessoas, que convivem e se fundem com as tecnologias disponíveis, fazendo destes aparatos extensões de seus próprios corpos". É importante salientar que a tecnologia da informática possibilita ao indivíduo a inclusão nesse novo espaço e a conquista de outros espaços até então utópicos para algumas pessoas, porém o uso dessas tecnologias requer habilidades e adaptações a estas novas ferramentas computacionais. Sobre esta perspectiva, Bolaño (2007) argumenta que é importante destacar que a tecnologia por si não garante a operacionalização das possibilidades advindas da digitalização. O uso da ferramenta de forma diferenciada e ampliada tanto na produção, como distribuição e articulação dependem, principalmente, do uso e da apropriação que os trabalhadores fazem dela.

    A apropriação dessas tecnologias mesmo que de caráter virtual, podem transformar radicalmente não somente as relações sociais de um indivíduo, mas também gerar mudanças drásticas no espaço físico a partir da mediação virtual para eventos físicos e de grande escala, com consequências de grande impacto para o mundo, como guerras entre países e destruição. Dessa forma podemos ter o ciberespaço que ao mesmo tempo em que proporciona a evolução do processo de comunicação e acesso à informação, pode ser um perigo para a sociedade, a depender do uso e da apropriação desse espaço, principalmente por ser um meio rico para a comunicação a partir do aumento do número de usuários (HINE, 2005).

    A multiplexidade que envolve as novas tecnologias, num aspecto metodológico de investigação científica, pode transpor a discussão da evolução tecnológica em si para as questões de sociabilidade e apropriação, "o agente de mudança não é a tecnologia em si, e sim os usos e as construções de sentido ao redor dela" (HINE, 2005: 13). Nesse sentido a autora defende a utilização da etnografia virtual, ou seja, uma etnografia transposta ao ciberespaço como metodologia para suprir o espaço de estudo das práticas cotidianas em torno da internet. Segundo Hine (2000), "a forma pela qual a perspectiva etnográfica funciona para os estudos da internet é através do estudo de seus diferentes usos". Sendo assim, acredita ser uma metodologia ideal para iniciar esta classe de estudos, pois pode ser utilizada para explorar as complexas relações existentes entre as afirmações previsíveis acerca das novas tecnologias em diferentes contextos, como jogos, espaços de trabalho, meios de comunicação de massa, etc.

    Vídeo 2 – Etnografia Cultural / Fonte: Javier López


    Outra variação foi a criação do neologismo "netnografia" (net + etnografia), cunhado na metade dos anos 90 por Kozinets, que popularizou o termo em suas pesquisas relacionadas ao fandom, ao marketing e às comunidades de consumo online. A netnografia também leva em conta as práticas de consumo midiático (BRAGA, 2007).

     

    2 Ciberespaço: geração e distribuição de conhecimento e informação

    Na educação à distância, as interações ocorrem nos ambientes virtuais de aprendizagem. Esses ambientes são formados por um conjunto de ferramentas para a construção, que também disponibilizam e permitem a manipulação de material instrucional. Este conjunto de ferramentas, além de conter recursos para a manipulação de conteúdo, a partir de textos, imagens e gráficos, contém dispositivos para organizar dados, gerenciar informações e conteúdos, considerando a participação dos usuários conectados em rede nesses processos de comunicação síncrona e assíncrona. Pode-se dizer que:

    Os AVA consistem em mídias que utilizam o ciberespaço para veicular conteúdos e permitir interação entre os atores do processo educativo. [...] Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) consiste em uma opção de mídia que está sendo utilizada para mediar o processo ensino-aprendizagem à distância. (PEREIRA, SCHMITT, DIAS apud PEREIRA, 2007, p. 5).

    Batista (2000) define o AVA como lugar, onde estudantes e professores podem interagir psicologicamente com relação a certos conteúdos, por meio de métodos e técnicas previamente estabelecidos, visando à construção de conhecimentos. Os ambientes virtuais funcionam como "constelações de gêneros digitais", termo sugerido por Araújo (2005) por ser um espaço dinâmico, onde som, imagem, textos verbais e não verbais, hipertextos, e-books, vídeo aulas e outros recursos motivam a aprendizagem dos alunos.

    2.1 Chats

    Dentre os gêneros digitais, alguns dos mais utilizados no ambiente virtual, são: chat, fórum de discussão e wiki. Marcuschi (2004, p.28) elenca vários tipos de chats, dentre os quais podemos destacar: a) Chats em aberto: "inúmeras pessoas interagindo simultaneamente em relação síncrona e no mesmo ambiente". b) Chat reservado: variante dos room-chats, mas com as falas pessoais acessíveis apenas aos dois interlocutores mutuamente selecionados, embora possam continuar vendo todos os demais em aberto. c) Chat agendado: oferece possibilidade de diversos recursos tecnológicos na recepção e envio de arquivos. d) Chat privado: "são os bate-papos em sala privada com apenas os dois parceiros de diálogo presentes". (MARCUSCHI, 2004, p.28)

    2.2 Fóruns de discussão

    Segundo Santos (apud SILVA, 2006, p. 229), os fóruns permitem o registro e a comunicação coletiva por meio da tecnologia. Ainda conforme Santos (apud SILVA, 2006, p.229), nos fóruns, "emissão e recepção se imbricam e se confundem permitindo que a mensagem circulada seja comentada por todos os sujeitos do processo de comunicação".

    2.3 Wiki

    Um wiki proporciona a construção de textos de forma colaborativa, permitindo ainda, que os participantes trabalhem juntos, além disso, possam adicionar novas páginas web ou completar e alterando o conteúdo dessas páginas publicadas. O wiki é importante para a escrita colaborativa no ambiente virtual, porque promove uma maior interação entre os autores que, por sua vez, podem compartilhar suas experiências de produção textual. Esses gêneros digitais apresentados e vários outros gêneros digitais podem ser utilizados para os processos de comunicação mediada por computador (e -comunicação) proporcionando a interação, bem como geração e distribuição de conhecimentos de forma não linear.

     

    3 Considerações Finais

    Uma das características marcantes da sociedade contemporânea é a crescente presença das tecnologias no cotidiano das pessoas. A Internet, hoje, representa um suporte tecnológico fundamental para várias esferas de interações sociais, principalmente para a difusão de conhecimentos até então limitados por espaço-tempo e também geograficamente. A comunicação vem sofrendo, cada vez mais, mudanças a partir de aparatos tecnológicos e da apropriação do espaço virtual que a Internet proporciona. Desta forma, a educação vem utilizando os artifícios tecnológicos dos computadores em rede para criar situações de aprendizagem condizentes com o mundo atual e, de acordo, com as demandas da sociedade do conhecimento. Mesmo assim é um ambiente que se apresenta ainda desconhecido e com um amplo caminho a ser percorrido, exigindo dos indivíduos que interagem e se apropriam desse espaço, uma adaptação e aprendizagem nos processos de construção do conhecimento mediados e gerados a partir destas tecnologias. Esse novo ambiente, distinto por suas características particulares, exige um comportamento diferente, uma nova cultura, conhecida como cibercultura.

    Referências

    ARAÚJO, Júlio César; BIASI-RODRIGUES, Bernardete. "A natureza hipertextual do gênero chat aberto". In: ARAÚJO, J. C.; BIASI-RODRIGUES, B. Interação na Internet: novas formas de usar a linguagem. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005. p. 48-62.

    BATISTA, Miguel Herrera. "Consideraciones para el diseño didácticode ambientes virtuales de aprendizaje: una propuesta basada en las funcionescognitivas del aprendizaje". Revista Iberoamericana de Educación. 2000.

    BOLAÑO, C.R.S.; HERSCOVICI, A.; VASCONCELOS, D.; CASTAÑEDA, M. Economia Política da Internet. Editora – UFS, maio de 2007.

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    KOZINETS, R. V. On netnography: Initial Reflections on Consumer Research Investigations of Cyberculture. Evanston, Illinois, 1997.

    LEVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo: Ed. 34, 1999.

    LEVY, Pierre. Cibercultura e inteligência - Vídeo Programa Roda Viva. Acessado em 08 de julho de 2015.

    LOPEZ, Javier. Etnografia Virtual. Acessado em 21 de julho de 2015.

    MARCUSCHI, Luiz Antônio. "Gêneros textuais emergentes no contexto da tecnologia digital". In: MARCUSCHI, L. A.; XAVIER, A. Hipertexto e gêneros digitais: novas formas de construção de sentido. Rio de Janeiro : Lucerna.2004.

    PEREIRA, Alice; SCHMITT, Valdenise; DIAS, Maria Regina. "Ambientes virtuais de aprendizagem". In: PEREIRA, A. (Org.). Ambientes virtuais de aprendizagem em diferentes contextos. Rio de Janeiro: Editora Ciência Moderna Ltda. 2007.

    SANTOS, Edméa. "Articulação de saberes na EAD online. Por uma rede interdisciplinar e interativa de conhecimento em ambientes virtuais de aprendizagem". In: SILVA, Marco. (Org.) Educação online. São Paulo: Edições Loyola.2006.

    TEIXEIRA, Adriano Canabarro. "A educação em um contexto de cibercultura". Revista Espaço Acadêmico, n.139, dez/2012, ano XII.